30.11.05

CARTILHA 4800 - LETRA L

Luciano ladra a Lisete, uma loura lavadeira de Longos. "Luciano, larga a LSD", diz Lisete depois de, num longo ósculo, lamber os lábios e a língua a Lena, uma longilínia lésbica de Leitões.

28.11.05

GUIA PRÁTICO DO VERDADEIRO PINHEIRISTA

Como habitualmente desde tempos imemoriais, Guimarães recebe, por esta altura, as festas académicas mais antigas do País: as festas Nicolinas. Como se sabe, estas festas começam amanhã, com o cortejo do Pinheiro, que é a primeira e última das festas com participação massiva das massas.
Se o caro leitor não é um vimaranense ou só agora chegou à cidade e tem sérias dúvidas sobre o comportamento a adoptar neste certame, o melhor é ler os conselhos que se seguem, e tornar-se um autêntico verdadeiro pinheirista.
O espírito do Pinheiro, como se sabe, consiste em agarrar numa velhinha caixa ou bombo e desfilar pela cidade com o estômago aconchegado de nacos rojoentos e o fígado demolhado na mais impura mistela de vinhos verdes tintos de qualidade mais que duvidosa. Há mesmo quem diga que o principal objectivo do Pinheiro é tarataratumbar em proporção inversa a um cambalear cada vez mais etilizado. Contudo, na opinião deste blog, isso são meras bocas da reacção cuja proveniência conhecemos mas, por questões de pundonor, não queremos divulgar. O que interessa no Pinheiro não é o coma alcoólico ou algo próximo, mas sim vomitar rojões ao raiar da aurora com uma das mãos apoiada na porta do café Nandes junto ao Liceu. Assim, para chegar até este clímax espiritual, é necessário acompanhar escrupulosamente os seguintes passos:

1 – Marque o jantar com alguma antecedência e solicite rojões de vaca. O pedido causará perplexidade no dono do restaurante que passará a olhar para si como um connaisseur quer do certame quer das mais modernas tendências da haute cuisine minhota.
2 – Como se de um ramadão vimaranense se tratasse, passe o dia inteiro em jejum e coma uma torta de Guimarães para acamar só depois do ocaso solar. Assim, ao terceiro gole da malga de vinho, já sentirá os vapores da noite a abrilhantarem-lhe os olhos.
3 – No jantar, faça de conta que aqueles estranhos que partilham a mesa consigo são seus amigos do tempo da escola e saúde-os com a sempre popular frase “Ó meu c*****o, já nao te via há que tempo!” A este cumprimento deve seguir-se uma vigorosa palmada nas costas e um “vamos mas é beber, c*****o”. Pelo meio, invente uma história de porrada onde você foi um herói e alguém presente na sala - que você passará a olhar com desdém e superioridade até ao fim do jantar - apanhou um cocelo de si. O receptor da sua epopeia juvenil não se vai lembrar e a você resta-lhe a airosa saída do "Não te lembras, c*****o? Até foste tu quem nos separou".
4 - Agora que já está plenamente integrado, deve tomar a iniciativa e propôr o primeiro penalty da noite. É importante que seja o primeiro, porque antes de começar a comer ninguém gosta de fazer penalties. Ao propôr idiotamente o primeiro penalty da noite, pode ter a certeza de que todos se vão lembrar de si.
5 – Durante o jantar, opte por não falar muito e fazer as maiores alarvidades com o vinho, como por exemplo, mergulhar o rojão na malga e atirá-lo a uma pessoa que lá esteja seguido de um riso boçal. Pode também insultar a mesa do lado e atirar-lhes vinho, criando um conflito completamente desporpositado ou então falar alto, rir desalmadamente e recorrer frequentemente ao vernáculo, chamando paneleiro a todo e qualquer comparsa que se recuse a fazer os penalties por si propostos. Afinal, as nicolinas sao festas da virilidade. O importante é mostrar um à-vontade pouco natural e ingerir rojões sem os mastigar. Não se esqueça disto: ingerir rojões sem os mastigar.
6 – Depois de jantar, pegue na caixa e desate a ensinar o toque nicolino a toda a gente: corrija tempos e contratempos. Sinta-se o autêntico baluarte deste secular toque. O importante aqui - para além dos toques e correcções - é assumir a figura de mete nojo, aliada ao uso de termos como espírito e tradição. (Por exemplo: no fim de jantar, urine-se todo junto ao restaurante e diga que é tradição fazer isso, que faz parte do espírito da festa.)
7 – No início do cortejo, tente ser original: toque o We Will Rock You e outras modinhas e ria-se a bandeiras despregadas. É importante que toque mal o toque do Pinheiro quer para destoar no cortejo - sendo ainda mais mete nojo - quer para ser prontamente corrijido. Não aceite tais correcções e diga que não admite lições de nicolinismo de ninguém.
8 – Se até agora seguiu os nossos conselhos, é natural que já tenha granjeado a antipatia dos seus pares e que os ânimos estejam, até, bastante exaltados, o que é um óptimo indicador de que está a ter sucesso. É nesta altura que deve dirijir-se a um dos seus pares e gratuitamente, acusá-lo de estar a tripar consigo. Atenção: a sua noite pode complicar-se se não tiver surripiado um cutelo de cozinha para efeitos de auto-defesa.
9 – Chegado aqui, tudo pode acontecer: ou receber um abraço fraterno da pessoa que acabou de acusar gratuita e selvaticamente ou, como cremos ser mais indicado, saborear, qual América Proibida, o frio do lancil de um passeio da cidade. Num ou noutro caso, o importante é manter a calma e o sengue frio. Para isso, deverá ter sempre consigo uma garrafinha de whisky de bolso. Quanto mais não seja, servirá de desinfectante para os ferimentos que possa já ter.
10 – Vamos partir do pressuposto que tudo isto descamba numa lamentável cena de pugilato: o primeiro passo é olhar em volta e ver se se ainda encontra sob as opacas vestes do anonimato. Em caso afirmativo, lance o berro indicador de que quem o agride é bracarense. A turba, sempre sedenta de contacto físico, tratará do resto. Nesta altura, já deve ter feito trinta grandes amigos, todos ex-colegas de escola, que o convidarão, certamente, para tocar nos seus bombos. Toque com fúria até lhes rasgar a pele. Diga que está cego com a situação. Mesmo que ninguém saiba a que situação se refere, esta frase fará de si alguém temível.
11- É chegada a altura do enterro do Pinheiro, momento em que já deve estar completamente etilizado, incapaz de vociferar algo mais que um palavrão. A postura a adoptar deve ser de extrema solenidade e concentração. Faça um esforço. Afinal, você está quase a conseguir ser um verdadeiro pinheirista. Olhe para A árvore e tente chorar. Diga a todos os que o rodeiam que veio de propósito do Canadá, que deixou lá ficar o filho doente para não faltar ao Pinheiro. Caso não se sinta capaz de proceder assim, dirija-se a uma barraca de cerveja e tente bater o seu record de finos de golada. Espere, então que tudo termine.
12 – É altura, agora, de rumar ao Liceu para o grand final. Há que aparecer solitário, com o olhar à procura de alguém que não vai encontrar. Encoste-se a um canto e toque caixa até nao poder mais. Tente, para além do toque nicolino, a bossa nova, o free jazz e o heavy metal. Ninguém vai reparar. Como referimos no ponto 5, deverá ter ingerido sem mastigar, imensos rojões de vaca que, teimosos e misturados com imenso vinho, lhe empancam a digestão. Quando se sentir enjoado, acabe com o whisky que ainda tem na garrafinha e dirija-se, calmamente, para o café Nandes. Apoie a mão na porta e espere que os rojões, um a um, regressem à terra vindos do caldo pré ulcérico que é o seu estômago. Regresse a casa, com a sensação de dever cumprido, consciente que foi o maior verdadeiro pinheirista da noite.
Carlos Guimarães & Jacques Guimarães

MÁXIMAS SOBRE A VIMARANENSIDADE

Hoje de manhã, vi o Cléber na Avenida de Londres. Olhei para ele e ele olhou para mim. Mudei de passeio para não sofrer falta.

25.11.05

UM DITADOR LOCAL

Geralmente pelas 18 horas costumo estar em casa a fazer uma de duas coisas:
a) a visionar uma interessante série televisiva sobre uma certa (existente?) juventude, passada num colégio perto de Lisboa, chamada “Morangos com Açucar” ( se fizerem a versão vimarense a serie mudará de nome para “Punhetas de Bacalhau”).
b) a fazer meditação transcendental.
No passado dia 22, encontrava-me a fazer meditação transcendental (acho que estava quase a atingir o Nirvana, ou pelo menos a ficar com um formigueiro). De repente um mínimo ruído quebrou a minha concentração: tinha deixado ficar uma torneira aberta na casa de banho.
Após este momento perturbador e ao fechar com veemência a torneira, aflorou--me uma ideia que poderá ter um certo interesse. E se o presidente da Câmara passasse a ser um ditador?
Se é certo que um ditador em princípio não proporciona benefício nenhum a lado nenhum, o que é facto é que a existência de uma figura de contornos ditatoriais chama a atenção e é altamente mediática. Veja-se o caso de A. João Jardim, demo(crata) e ditador naquele pequeno jardim do éden onde a qualidade de vida de parte da população convive com a falta de liberdade de expressão de uma certa maneira de encarar o funcionalismo dependente do Governo Regional. Deixando estes pequenos detalhes sem importância de lado, já que para a maioria deste solarengo Portugal isto parece não importar, o que é facto é que o homem chama a atenção. E é ve-lo bêbedo no Carnaval, bêbedo a apoiar o Marítme (Marítimo no dialecto local) e bêbedo a insultar o Marques Mendes e o contenente ( Portugal continental no referido dialecto). E onde é que o vemos sempre? Na televisão e nos jornais, a ele e à Madeira. E é aí que eu quero chegar. É ai que Guimarães tem de chegar. À televisão (é que nem no Pinheiro!) e aos jornais (é que nem no Pinheiro!!)
É, pois, aqui em Guimarães, que tem que surgir alguém do mesmo calibre. Uma Fátima “Perón” Felgueiras, um Major Valentim “eu gosto muito da comida do exército” Loureiro.
Já estou a imaginar os discursos inflamados do alto de uma janela do Toural, as aberturas de telejornais com as atoardas do presidente (ou atordoadas, como disse uma vez o cultíssimo Dr. Vale e Azevedo quando não lhe chegou a lingua num debate).
E a situação, com um ditador deste género, nunca poderia ficar pior. Temos uma cidade bonita mas paradinha, uma universidade que é como se não fosse de Guimarães (por culpa de quem? Não sei...) e vamos ter cerca de 30000 desempregados até 2010 (sim, aqui em Guimarães!). Temos todos os ingredientes para o caldo da crise social.
O tal ditador traria a Guimarães gentes (jornalistas, polícias, juízes e advogados de Lisboa e Porto) que movimentariam o moribundo comércio tradicional. Uma população de desempregados teria alguém para odiar e espumar a sua raiva. Aos boémios, artistas, escritores, colunistas (enfim, aos pequenos mas cultos privilegiados) daria uma figura para, sem medo, criticar e, porque não caricaturar.
Se este Messias surgir, “a realidade comovida agradece, porque sabe que foi por ela o sacrificío”.
Otelo de Guimarães

CARTILHA 4800 - LETRA J

Justino, um jovem javardo, joga nos juniores da Juni, com Jardel, um judeu de Jerusalém. Depois do jogo contra o Mogege, juntos jantam javali no Jacinto, nos Jagunços.

24.11.05

4 MIL & 800 - UM MÊS

É verdade. Este sítio completa hoje um mês de existência. Ao longo de trinta dias fomos visitados por mil leitores, o que constitui um óptimo indício e uma tareia monumental no Expresso do Ave e no Povo de Guimarães que, seguramente, não terão tantos leitores, bem como na Rádio Fundação que não deve ter tantos ouvintes. Oh, leitor amigo, agradecemos-lhe por nos ter visitado e passado a palavra para que este síto vá crescendo, frondoso como o eucalipto de Urgeses. Pela nossa parte, tudo faremos para o manter feliz (ao eucalipto e ao leitor).
4800 Vivas.

TOURALISTAS, BOLTONENSES E UM JARDIM ZOOLÓGICO.

Completamente alheio a tudo aquilo que se tem passado no mundo do futebol, e acabado de regressar a Guimarães, vindo de assistir ao Turquia-Suiça, seguido de umas férias no bairro de Galatasaray, deparo-me com a Praça de Santiago pejada de pessoas a falarem inglês. Indiferente às indumentárias que traziam, exclamei para mim próprio: "porra, o Instituto Britânico anda a formar cada vez melhor!" Foi só depois de ter entrado, via Porta da Vila, no solarengo largo do Toural que me apercebi que a turba anglófona se espalhava pela cidade e que constituia a massa adepta dos Bolton Wanderers. Pouco passava das onze da manhã e a cervejaria Martins já estava à pinha com dezenas de boltonenses a tomarem um pequeno almoço à base de sumo de lúpulo. Nada contra, antes pelo contrário. Do outro lado da rua, e em número não inferior aos boltonenses, estavam dezenas de touralistas com mais de cinquenta e cinco anos. No meio, apenas quatro polícias. Num ápice, pensei numa batalha à antiga, parecida com aquela que opôs os Jagunços aos adeptos do Aston Villa, no longínquo ano de 1983. Mas não. E ao compreender que nenhum desacato iria acontecer senti-me perturbado. Afinal, os meus conterrâneos estavam ali num exercício de voyeurismo deplorável, desprovido de sentido cosmopolita, apenas e só olhar para os ingleses como se de avis rarae se tratassem. Estavam, como se diz, a ver. E a ver um inglês a beber cerveja, como se fosse um panda proveta acabado de nascer. Tudo isto revela falta de contacto com o que é novo e reforça a qualidade de voyeur do touralista. Era preferível, do ponto de vista cosmopolita, ter ficado a ver as obras a avançar e não ligar aos boltonenses, mesmo que essa fosse a maior das vontades. Eles, seguramente, iriam pensar que esta cidade era uma verdadeira metrópole, onde reina a indiferença. Com esta atitude, os touralistas vincam a necessidade de um jardim zoológico na veiga de Creixomil, para que a intensidade do seu olhar não se perca. Afinal, eles também devem ser património.
Carlos Guimarães

23.11.05

OS ESCARRADORES

As cidades fazem-se de pessoas. A alma das gentes é a seiva da urbe. Não é à toa que se diz que os habitantes do centro histórico de Guimarães são, também eles, património da humanidade: seja pelos lençóis virginalmente brancos que secam nas varandas ornamentadas de flores, seja pelo amor com que chamam filho da puta ao seu melhor amigo. As gentes são, portanto, património imaterial desta cidade. Ora, dentro deste tipo de imaterialidade patrimonial – as pessoas da cidade – há uma categoria que me causa particular admiração, traduzida num misto de nojo e fascínio que não consigo verbalizar. Refiro-me ao vasto grupo dos escarradores, essa raça que, em pleno século XXI não tão só cospe no chão, como ainda por cima faz questão que toda a gente num raio de cem metros saiba que alguém se prepara para aplicar e aplica uma bojuda e espessa escarradela no meio do secular granito made in china que ornamenta os nossos passeios.
Mas quem é esta massa humana que, de tempos a tempos, quebra a melancolia dos passos apressados nas nossas ruas com um valente grunhido escarral, que parece porvir do mais profundo dos infernos? Eles são homens e mulheres, dos sete aos setenta e sete anos, do engraxador ao senhor doutor, que vivem em redor da célebre máxima do “mais vale cá fora do que cá dentro”. Num mundo de aporias, eles têm a certeza. Num mundo angustiantemente introvertido, eles são mucosamente extrovertidos. Num mundo de contenções, eles expressam a insatisfação quotidiana cuspindo em alto e bom som. E mais: fazem-no com o pré aviso do puxo de escarro, ou seja, aquele inspirar catarrento, feito por camadas, capaz de eriçar os cabelos a uma estátua, como quem diz “quem quiser que se desvie, a verdinha vem aí”. Não devemos os nossos maiores arrepios nesta cidade ao cristalizar dos raios solares no granito molhado pela chuva, nem à onírica beleza da praça da Oliveira numa manhã de sol. A maior causa de arrepios que esta cidade produz é, sem dúvida, o cruzamento com um escarrador durante o puxo de escarro e aqueles eternos segundos de temor e dúvida de saber se o produto esmagmento daquela equação orgânica não vai sair cruzado e aterrar direitinho na lapela de um qualquer nosso casaco, comprado no Mindos, ao largo do Toural.
Jacques Guimarães

21.11.05

CARTILHA 4800 - LETRA I

Isidro, inocente vitivinicultor, vai incendiar um pinhal em Infantas, por indicação de Ismael, um incendiário e pirómano de Vizela. Isidro equivoca-se no itinerário e incendeia um pinhal em Infias. “Idiota, imbecil”, grita Ismael a Isidro, indo a Infias enfiar-lhe uma inesquecível tareia.

18.11.05

DISCURSO SOBRE INCOMPREENSÕES VIMARANENSES (1)

Caros Concidadãos:

(inspirar)

No meio de tanta associação porreira em Guimarães - Cineclube, Muralha, [Convívio], Associação de Apoio à Criança -, no meio de tanta associação mediana em Guimarães - Associação Vitória Sempre, o moribundo Círculo de Arte e Recreio (não te deixarei morrer, C.A.R.), o praticamente inerte Fórum Vimaranis (que ainda vai ter problemas com uma grande superfície comercial a inaugurar em Silvares)-,

no meio de tanta associação-que-não-se-sabe-muito-bem-para-que-raio-é-que-servem-e-até-são-um-bocado-obscuras - Associação Social Mútuos Artistas Vimaranenses, Centro Infantil Cultural e Popular e Assembleia de Guimarães –,

(respirar fundo)

onde é que ainda há lugar para uma associação chamada Grupo Cultural Recreativo "Os 20 Arautos"? Em primeiro lugar, gostava de saber se são só vinte. De seguida, um vasto ror de questões assola-me a psique: o que é que estes senhores fazem para merecer um palacete na rua Gravador Molarinho? É aquela marcha com velinhas no Primeiro de Dezembro? E é preciso uma associação para por pouco mais de uma vintena de tipos a andar pelas ruas e a tocar cornetim? É só isso que faz com que eles tenham o direito de chamar a si as palavras “cultural” e “recreativa”? Se ao menos fossem a Associção dos 20 Arautos que Marcham no Primeiro de Dezembro, a coisa era menos má. Mas do mal a pior: porquê uma associação dessa estirpe com sede num edifício daqueles, que poderia ser explorado para o famigerado Museu Afonso Henriques - ?

(pausa) (tom sério)

É preciso mudar muita coisa nesta cidade, caros Concidadãos. Começar com a mais que legítima expropriação dessa dita associação de notória inutilidade é a luta que todos devemos travar para bem da nossa cidade.

Jacques Guimarães

A ILUMINÁRIA NATALÍCIA

Foi com um enorme “oh”, seguido de uma interjeição vernacular do mais baixo nível que constatei que em algumas ruas do centre-ville já estão meticulosamente colocadas as sempre-induzíveis-em-alegria luzes de Natal. Ora, como sou um fervoroso adepto da trivialidade vimaranense – as questões políticas ou as deixo para os excelsos opinion makers desta pólis ou para mim mesmo quando estiver para aí virado e desatar a metralhar em alguém – ora, como sou um fervoroso adepto da trivialidade vimaranense, dizia, não deixo de assinalar a desinteligência desta colocação pela seguinte ordem de factores:
a) Ainda falta mais de um mês para o Natal e não é, seguramente, por causa das iluminações que as pessoas vão comprar mais coisas.
b) Ainda falta mais de um mês para o Natal e o meridiano vimaranense não está psicologicamente preparado para a filantropia e espírito natalício que tal luminária provoca nesta altura do ano.
c) A colocação das ditas luzes antes da festa do Pinheiro é um claro incentivo a todos aqueles que, como eu, embebidos em tinto e espírito nicolino, as tentem destruir de qualquer forma, num acto de vandalismo sempre apetecível e encapuçado pela opaca manta do anonimato.
Em conclusão, só falta o mayor de Guimarães, em cerimónia espampanante e acompanhado de uma celebridade telenovelar, ligar o interruptor...
Jacques Guimarães

15.11.05

PENSAMENTOS INÓCUOS SOBRE A CIDADE

GUIMARÃES E AS GEMINAÇÕES

Acho que seria de muito bom tom se Guimarães rasgasse os contratos de geminação que tem com cidades como Igualada, Londrina ou Kaiserslautern. No fundo, uma cidade como Guimarães só pode aspirar a geminar-se com cidades de igual calibre, ou seja Tirana, Urbino, Lodz, Rio de Janeiro, Kiev ou talvez Dublin. Agora, uma vila dos subúrbios de Barcelona, uma cidade insignificante no Brasil ou uma cidade cujo nome, para um vimaranense meridiano, é quase impossível de pronunciar... por favor, não me venham com essa: soa tudo a geminação artificial.

Jacques Guimarães

4800 TOPS - OS TRÊS MELHORES CANTAUTORES VIMARANENSES

1José Alberto Reis, o Júlio Iglésias da Av. S. Gonçalo
2Dino Freitas, o Marco Paulo de Azurém
3Tino Flores, o Zé Mário Branco de Vila Verde

(De notar a semelhança da terminação dos nomes próprios do Top 2 e do Top 3, similaridade essa que levanta grandes dúvidas. Será que o próximo cantautor vimaranense na estrelada rota do sucesso terá como nome próprio Nino? A exclusão de Bino Chouriça é justa? Será - ou terá sido - Bino Chouriça um cantautor?)

14.11.05

VAMOS OUSAR

Encontrava-me, há uns tempos atrás, na casa de campo de um velho amigo e, ao vasculhar sem a sua autorização a sua extensa biblioteca, encontrei “O Jogador” de Dostoievsky. Decidi, então, começar a reler está notável obra. A edição, antiga, era dos defuntos e míticos Estúdios Côr (que têm a melhor edição em português das “Mil e Uma Noites” edição essa que, obviamente, possuo).
Ao viajar por este magnifico O Jogador voltei, como seria de esperar, a encontrar todos os personagens que dão vida a esta fantástica narrativa (digo isto porque em 1976 ao reler o agora muito em voga “Crime do Padre Amaro” o dito padre não estava lá, o que me levou ao meu primeiro internamento num hospital psiquiátrico). A releitura desta obra fez-me deter, uma primeira vez, na mademoiselle Blanche o que, num exercício mental rápido, me recordou o poema “Pastelaria” de Mário Cesariny. Ao continuar a minha leitura, voltei a parar uma segunda vez porque me surgiu uma ideia que poderá revolucionar Guimarães.
Este livro descreve, entre outras coisas, um ambiente de jogo, de glamour e das complexas ligações humanas entre os personagens. Foi o precisamente o jogo que me fez parar e pensar.
Guimarães está a passar, como toda a gente sabe, por uma crise. O desemprego irá subir em flecha até 2010 e a crise social será intensa. Não será um casino a solução para muitos destes problemas?
A reposta é, obviamente, sim. Há em Guimarães mercado para o jogo. Existem até dois casinos ilegais na nossa cidade. Não faltariam, por isso, potênciais clientes para este tipo de serviço. O casino, a existir em Guimarães, seria uma importante fonte de receitas para a autarquia e seria um pólo gerador de empregos. Por outro lado, com as receitas do casino podia-se reactivar o Teatro Jordão, o cinema do Centro Comercial Castelo e os cinemas do Centro Comercial Santo António (à semelhança do que se quis fazer com o Parque Mayer). Para além disto tudo, uma eventual crise social relacionada com a dependência do jogo será muito mais cosmopolita do que a mesma crise relacionada com o desemprego ligado ao sector textil...
Já estou a imaginar as termas das Taipas dotadas de um Casino-Hotel, o rei Alberto do Mónaco a vir fazer um tratamento a eventuais problemas cutâneos que possa vir ter, o seu cunhado Ernst de Hannover a gastar uns cobres no casino e a sua irmã a enamorar-se por um porteiro do Tropicana (ou da discoteca Manias, se ainda estiver em funcionamento). Este seria, sem dúvida, o modelo convencional de casino a ter em Guimarães.
Mas Guimarães não quer ser convencional. E ao olhar para o Paço dos Duques ocorre-me uma ideia colossal. Transformar aquele palácio, que não é mais que uma recriação bacoca feita no Estado Novo, num espaço de jogo de excelência: o Casino dos Duques ou o Paço do Jogo. Seria Las Vegas! Ou em bom vimaranense, Las Veigas. Acorreriam à nossa cidade turistas de todos os cantos do globo. Uns para se divertirem numa infraestrutura única. Outros para verem ao vivo uma das maiores aberrações jamais feitas numa cidade património mundial!
É urgente dotar Guimarães de um casino.
Vamos ousar.

Otelo de Guimarães

CARTILHA 4800 - H

Hoje houve um holocausto horroroso nas Hortas com hordas de homicídas heroinómanos, de hálito horrível, em acção. Herculano, o herói hercúleo, hostilizou os homicídas mas ficou com um hediondo hematoma. Foi ao Hospital e descobriu que tinha uma hérnia, herpes, hepatite e o HIV. Hélas!

10.11.05

1, 2, 3, 4800 GUIMARÃES JAZZ!

De 10 a 19 de Novembro, Guimarães recebe mais uma edição do Guimarães Jazz. Um festival que, segundo os vimaranenses, se assume como um dos melhores do país. Mas o Guimajazz é muito mais que isso: é uma das grandes feiras de vaidades da cidade. É um festival para além da música, onde o que importa mais é ver e ser visto, bem como demonstrar alguns, senão mesmo muitos, conhecimentos sobre jazz. Nunca há um concerto mau e gosta-se de tudo: das big bands aos experimentalistas, passando pelos clássicos. "Muito bom", diz-se sempre.
No fundo, a cidade enche-se de Antónios Curvelos e Josés Duartes de algibeira, e todos à procura uns dos outros. Não se pergunta se se vai ver determinado concerto. Antes se questiona “vais ao jazz?” e pronto. Como se fossem jogos de futebol. E ir ao jazz em Guimarães é claramente “in”, tal como ir ao Estoril Open ou ao Festival do Sudoeste. No pólo oposto, não releva nada ir ver um grande concerto de jazz a Famalicão.
Não basta esta “inidade” do Guimajazz. Para além dos olhos que, nictitantemente, procuram ver e ser vistos, convém mandar o máximo de sound-bitaites possíveis para se revelar um entendido na matéria. Ora, como a maioria dos espectadores do Guimarães Jazz não é verdadeiramente fã do género, o 4800 GMR deixa aqui um pequeno guia básico para que se esta edição do Guimarães Jazz seja a da consagração de cada um enquanto visível amante do género.

Introdução
Tony Wilson, o lendário patrão da Factory Records, disse um dia que “o jazz é o último refúgio dos sem talento: os músicos de jazz divertem-se muito mais do que quem os ouve”. Ora esta é uma inegável verdade. Sabemos perfeitamente que não se vai divertir tanto quanto os músicos que tocam cada um para seu lado e que vai até sentir algum tédio. Por isso, e porque há algo mais importante do que a música em causa, siga as seguintes instruções. Lembre-se que o lema deste festival devia ser "Ao espectador não basta ser jazzy, também tem que parecê-lo"

Antes dos Concertos. O que devo dizer? Como devo agir?
a)
O primeiro requisito é chegar cedo ao recinto. Segue-se uma fase de socialização forçada onde pode sempre mandar dois ou três bitaites sobre o músico que vai actuar. Para isso, convém, previamente ir aqui e pesquisar. O que soa melhor é sempre o “sabias que o Xis já tocou com Ypsilon? Sim, foi num álbum de mil novecentos e troca o passo”. O sucesso começa sempre por estes pequenos pormenores.
b) Criticar o Guimarães Jazz e denunciá-lo como um lugar de ver e ser visto é o segundo passo a seguir, ainda na fase de socialização. Diga que vem a todos desde o primeiro, afirme com resignação que "isto já não é o que era, os primeiros eram muito melhores", fale dos memoráveis concertos da Betty Carter e do Mal Waldron. Afirme sem papas na língua que o concerto do Brad Mehldau o desiludiu um pouco.
c) Se se sentir sem assunto, cite de cor a obscura nota de programa escrita por Ivo Martins. Pérolas como a que se segue não podem ficar na gaveta: “o que nunca foi capaz de ter saído do estado de concordância ou do estado de um assentimento concordante tende a atrofiar-se e a morrer rapidamente. Um dos aspectos mais importantes do Guimarães Jazz, situa-se no suceder dos acontecimentos nos quais se estava, por vezes, muito longe de imaginar o número de consequências pelo aparecimento de discursos alternativos, pelas narrativas interessantes e úteis que vieram a promover novas aberturas”. Percebido?
d) Em alternativa, diga com confiança que o “Love Supreme”, de John Coltrane, é o melhor álbum de jazz de sempre e recuse-se a explicar porquê.
e) Afirmar que há muito que anseia ver determinado concerto: “ehpá, aos anos que andava para ver estes gajos”. Nota prática: não perguntar se o Lester Bowie vem com a Art Ensemble of Chicago – uma vez que ele já não vai a lado nenhum com ninguém - nem aplicar a frase recomendada ao concerto da Maria Schneider, pois ela já cá esteve.

Durante os Concertos. Como me devo comportar? Como parecer que gosto mesmo de jazz?
f) O voyeur de jazz, mesmo que não seja um ècouteur, deve fazer um ar grave e sombrio. Como se estivesse efectivamente a pensar no que está a ouvir. O rosto deve estar sempre sério, com leves sorrisos a roçar o cinismo cada vez que há um solo.
g) Bater o pé ou a mão, a acompanhar o ritmo da música e fazê-lo de modo suficientemente ruidoso para ser notado pelos que estão mais próximos de si. Quando eles olharem, feche os olhos e finja-se mergulhado na música. Abane a cabeça como se estivesse a dizer não. É o primeiro passo para que todos sintam inveja de si por conseguir deixar-se embalar pela melodia.
h) Um dos musts do Guimajazz consiste em berrar, de tempos a tempos, um “Yeah”. È cosmopolita, jazzy e fica sempre bem. O ideal é berrá-lo depois de um qualquer solo. Contudo, também pode ser berrado logo que acorde a meio de uma música.
i) Aplaudir um tema aleatoriamente. Faça-o logo que soem os primeiros acordes. Todos vão pensar que quer o tema é muito conhecido e que o deviam aplaudir também – o que acaba sempre por acontecer - e que você reconhece temas à segunda nota (logo, um entendido na matéria).

No fim dos concertos. E agora? Como demonstrar que gostei imenso do concerto?
j)
Mesmo que esteja estafado (a) de um dia de trabalho acrescido de um concerto de jazz de alguém de quem nunca ouviu falar, mesmo que depois do concerto só lhe apeteça meter a cabeça num balde de água da Penha, não deixe de emitir opinião sobre o que acabou de ouvir. Argumentos qualificativos no jazz há imensos. Desde o “concerto foi pouco equilibrado” até ao clássico “muito cromático, mesmo muito cromático”, passando por "o fulano tratou muito bem o piano" tudo é permitido. O meu preferido é, claramente, o “ehpá, estes tipos fizeram uma má gestão dos silêncios”. Arrasador.
k) Ir às sessões de compota do Convívio e gostar delas, ou melhor, achá-as sempre espectaculares. É durante essa altura, e já de whisky na mão, que deve abordar alguém que conheça de vista e, relativamente ao concerto principal, dizer-lhe (é talvez a única altura onde a expressão a usar tem um sentido intelectual) “que concerto do c****o”.
l) Mais para o fim da noite, assuma-se como fã do free jazz. Diga que é o que lhe afaga a alma nas noites frias de inverno. Mencione nomes como Ornette Coleman, Peter Brotzmann, Conny Bauer, e Pal-Nilssen Love e vai ver que todos o passam a olhar com muito respeito.

Depois disto, todos ao jazz para o ver e ser visto.
Jacques Guimarães

8.11.05

CARTILHA 4800 - G

Guga, gatuno de Gondar, gama guito, guloseimas e ganza aos gunas de Guimarães. Guilho, o gago, sofre de gota e não é guna, mas Guga, galvanizado pelos grandes gamanços, gama a ganza a Guilho. Glória, a guarda, caça Guga em flagrante e golpeia-o nos guizos. Guga golfa sangue. "Gostaste?" Pergunta Glória.

7.11.05

PASSEIOS PELA CIDADE

Ontem passeava calmamente pelas ruas de Guimarães. Vinha a descer a Avenida Afonso Henriques, depois de me ter passeado pelo bairro de Urgeses, onde tenho vários amigos. Subitamente, e sem que nada o fizesse prever escorreguei e caí de costas no passeio. Apesar de estar acometido de dores agudas e de ter uma forte dor no pescoço ainda consegui vociferar alguns palavrões.
Mais tarde, já em casa, mas ainda com dores pus-me a reflectir na razão pela qual tinha caído.
A resposta é obvia! Caí por causa do pavimento.
Na verdade naquela artéria da nossa cidade, à semelhança do que sucede em muitas outras, o piso é a”calçada à portuguesa”, composta por pedrinhas de calcário brancas e negras formando padrões, a maioria das vezes, de gosto duvidoso.
Pois bem, esse piso, para além de ter uma estética que não coaduna com as linhas mestras e graníticas da nossa cidade, constitui um perigo sério para os transeuntes que como eu usam sapatos de sola.
Na minha opinião, Guimarães devia já encabeçar um movimento para substituir a calçada à Portuguesa de todos os passeios das cidades do norte de Portugal.
Vamos substitui-la pela calçada minhota, mais bonita, barata e segura, a bem da cidade.
Carlos Guimarães

6.11.05

CARTILHA 4800 - F

Num desafio de futebol em Fermentões, Flávio faz falta sobre Felício, que o fintou. "Facínora, fizeste-me o fémur em fanicos", diz Felício em aflição e sofrimento, a Flávio, que frio e forte, finge que não foi falta.

4.11.05

GMR 4 800 000

A insegurança nas ruas da cidade aumenta. Depois de, na festa do Pinheiro do ano passado, dois jovens de origem árabe terem sido violentamente espancados com maçanetas de bombo ao ritmo da boneca, as ruas de Guimarães são o espelho da tensão social em mergulhou a Europa. Ainda ontem, no grande subúrbio de Gonça, habitado maioritariamente por imigrantes oriundos do Magrebe, houve um motim que originou fortes e violentos confrontos com a polícia. Foram incendiados carros, um restaurante de Kebab e um supermercado Freitas. É o preço a pagar por viver numa das mais vibrantes metrópoles da Europa.

O SEXO E A SAUDADE

O estimável leitor andará de bem com a oferta de cinema em Guimarães. Com efeito, salas não faltam e até já foram mais. A uma programação comercial das Castello Lopes, responde o Cineclube com o melhor do catálogo de filmes ditos alternativos. A isto acresce uma gestão antropofágica do decrépito cinema S. Mamede, com filmes do pior mainstream que se vai vendo, muitas vezes repetindo o que se nos é oferecido nas Lameiras. Equilíbrio, portanto, concluirá o leitor em uníssono comigo. Pois eu não concordo e prego-lhe, destarte, uma perniciosa rasteira. A programação de cinema em Guimarães roça a mediocridade por uma única razão: falta a exibição de películas pornográficas. Quem não sente saudades de uma boa matinée a visionar A Penitenciária das Devassas no Cine-Teatro Jordão? Quem não sente a falta de lançar um olhar lascivo aos cartazes ali ao lado da Casa Giola? Quem não sente a ausência da adrenalina provocada pelo aproximar do “Pilhinha”?
Entre faltas ao trabalho e / ou faltas às aulas, demos asas ao nosso desejo, para fazer um trocadilho cinéfilo. Sejamos honestos: todos lá fomos. Nem que fosse para encontrar alguém conhecido para gozar mais tarde. Esta cidade sente a falta das lendárias sessões de cinema pornográfico que, em meados dos anos oitenta, faziam as delícias dos reformados que hoje passam horas a vislumbrar o andamento das obras públicas, de olhar perdido na nostalgia das curvas de uma Samantha Fox ou, quiçá, de uma Moana Pozzi. Foi graças a essas sessões que o Teatro Jordão ainda permaneceu aberto uns bons anos. Sem a pornada, veja-se o que lhe aconteceu. Por isso, caros leitores, em nome da diversidade cinematográfica, deixo aqui um repto ao único cinema que, pela sua mística, discrição e miserável estado financeiro, pode ainda fazer sonhar milhares de vimaranenses: sessões porno no S. Mamede, já.
Jacques Guimarães.

CARTILHA 4800 - E

Estou entristecido! Exclama Edgar, engenheiro electrotécnico de Rendufe, de férias em Esposende ao encontrar a esposa Ermelinda enrolada com Estevez, um espião espanhol.

3.11.05

4800 TOPS - TRÊS LUGARES CARISMÁTICOS DE PROSTITUIÇÃO DE RUA

1 – Campo da Feira - Apesar de ser um local recente de prostituição de rua vimaranense, a frequência e disponibilidade com que aí se oferecem recursos humanos ofusca por completo a Colina Sagrada, outrora a grande Meca da prostituição de rua em Guimarães.
2 - Colina Sagrada – Após anos a dominar a cena de rua vimaranese, foi recentemente ultrapassada pelo Campo da Feira. Não obstante o actual estado de decadência, ganha a medalha de prata por, alegadamente, ser o único sítio da cidade onde, a céu aberto, se oferecem sevícias de natureza homossexual.
3 – Estrada de Pevidém - Não seria justo centrar o top dos mais carismáticos lugares de prostituição de rua apenas nas artérias do centro da cidade. Esquecer a periferia prostituinte - a mítica borda de estrada - é um crime que o nosso blog não ousa cometer.

4800 TOPS tem o apoio de:

CIDADANIA & WATER CLOSETS

Com toda esta liberdade para dividir e combinar, enfatizar, ordenar, suprimir, completar e dilatar e mesmo distorcer, quais são os objectivos e restrições? Quais são os critérios para o sucesso da feitura do mundo?
Nelson Goodman, in Modos de fazer Mundos

Parto destas questões, colocadas por este reputado filósofo, e questiono-me sobre o modo como o meu mundo é feito e como este, por vezes, me restringe e retira a liberdade.
O meu mundo é, em grande parte, Guimarães e a minha liberdade está em cada passo que dou. Sou uma pedra viva da calçada humana que se funde e faz esta composição de granito: sinto-me um ser da cidade. Devo então, como cidadão, relatar algo que me sucedeu. E desde já vos digo que é intimista este relato que passo a descrever:
Noutro dia, corria a noite pelas suas cinco horas a contar da meia que marca o início da dita e, após ter comido uma boa pratada de moelas no Júlio (à Vila Verde), decidi passear um pouco antes de chegar a casa (um pequeno apartamento ganho ao jogo, situado na Urbanização do Infante).
Encontrava-me na rua de Sto António e, de súbito, senti uma guinada naquilo que penso ser o meu intestino grosso. Apressadamente comecei a descer a rua Francisco Agra, popularmente conhecida por rua de Sta Luzia (devido ao pequeno oráculo que lá se encontra dedicado a esta santa, de quem sou fiel devoto) para que a minha viagem para casa fosse mais rápida. Queria arrepiar caminho, caso contrário teria descido calmamente a rua de Gil Vicente (de quem sou franco admirador).
É aqui, na rua Francisco Agra, que começa a parte mais triste da minha narrativa. Não me contendo mais tive que defecar em plena via pública. Felizmente encontrava-se, na dita rua, uma camioneta de uma conhecida firma de iluminações que me serviu de refugio.
Tudo isto me fez levantar uma serie de questões. Percebo que seria despesista colocar um WC público em cada rua. Mas porquê só priveligiar (no perímetro do centro histórico) a rua de Camões e a praça de Santiago com estes equipamentos? Haverá dados estatísticos que comprovem que nestes locais há uma necessidade destes equipamentos mais premente que noutros? E não haverá a hipótese de pedir, em cada rua, a uma pessoa (ou a uma casa ou família) para que, mediante o pagamento de uma quantia simbólica ou através de benificios fiscais, torne o seu WC público, para que este possa acolher aquilo que são verdadeiros peregrinos da aflição? Ou, por exemplo, não se poderá colocar em cada rua um papel-ponto para que, pelo menos, as pessoas que tenham a infelicidade de obrar na via pública se possam limpar?
Nessa noite, Guimarães retirou-me a minha liberdade e a minha dignidade. E foi quando procurava uma folha para me limpar que recordei parte de um poema de Charles Simic: “Alguma travessa sombria que poderia/ Levar-me mais depressa a casa (...) E ninguém, graças a Deus/ A quem pedir instruções.”
Após esta situação passei cerca de dois meses fechado em casa. Comecei a sofrer de uma estranha fobia relacionada com a possível ausência de um WC perto de mim. Não conseguia estar a menos de cinquenta metros de um WC (foi esta minha estranha doença que serviu de mote à tese de doutoramento do meu psiquiatra, intitulada “ WCs e Dependências – De Tabuadelo a Tallinn, o medo de estar só numa Europa Unificada”).
Para terminar a minha triste história devo dizer que, por dois meses, me tornei menos cidadão graças ao egoísmo que grassa nesta cidade.
Não me calarei.
Otelo de Guimarães

GMR 480 000

Ontem fui ver e ouvir a Orquestra Metropolitana de Helsínquia ao Auditório Elisabete Matos. Como sempre, o Auditório estava à pinha. Ainda bem que reservei bilhete na vimaraticket.com. O concerto foi óptimo. No final, fui jantar ao tailandês mais próximo, em Santa Apolónia de Silvares. De seguida dirigi-me ao Jimmy's para ouvir jazz melancólico. Fiquei lá até às 4 da manhã. Apanhei o último NoctoBus para casa. Sabe bem viver numa cidade onde há sempre qualquer coisa para fazer em cada dia da semana.

2.11.05

A CIDADE DOS SANTOS

As comemorações do Dia de Todos os Santos, ocorridas ontem, um pouco por todo o mundo cristão, merecem-me o maior dos respeitos e a mais profunda das reflexões. Debruço-me sobre estas últimas para lançar a debate uma premente questão que atravessa todo o Portugal em geral e o concelho de Guimarães em particular. Porque carga de água é que esta cidade e este concelho têm uma inapelável queda para os Santos? Ele é Santo por tudo o que é lado e não há maneira de haver um milagre que seja nesta terra. O Vitória não ganha – um longo e agoniante domingo de Lázaro – a cidade não cresce, o desemprego aumenta, tudo isto sem que os Santos façam alguma coisa. E lá se continua vai pondo nome de Santo a tudo, do Hospital Nossa Senhora da Oliveira (mesmo contra a sábia e acertada opinião de um reputado médico da cidade, que entendia – e bem – que o Hospital se deveria chamar Abel Salazar) à pousada de Santa Maria, de Santa Marinha e ao Paço de S. Cipriano, isto só para ficar entre a hospitalariedade e a hotelaria. Até o segundo melhor restaurante de Guimarães – o S.Gião – tem nome de Santo. Mas o pior são mesmo as vinte e duas freguesias que ostentam nomes de santos. Acaso eles apareceram lá? Milagraram ali? Há provas? Porque raio nunca mais voltaram? Acham que pelo facto de terem o seu nome numa freguesia lhes dá o direito de abandonarem os seus fregueses? Em que é que a Santa Maria de Airão é diferente da homónima de Souto? Porque é que aparecem Santos repetidos no mesmo concelho? Há algum tipo de jobs for the saints? Onde pára Santo Tirso de Prazins? Candoso e Sande veneram o mesmo milagre de S. Martinho? Será que nos idos obscuros da Idade Média os Santos apareciam quase todas as semanas? E se sim, faziam milagres tão fixes que as populações lhes davam o nome dos seus lugares? Do género “olá malta, eu sou o S. Jorge, em vida fui um cavaleiro do século IV nascido na Capadócia, e salvei a filha de um rei que seria oferecida como sacrifício ao dragão que ameaçava a cidade. Apareci aqui porque apesar de turco tenho uma costela de catalão e vimaranense. Já agora, vou fazer um milagre que vai consistir no seguinte: fechais os olhos e depois aparece um rio a que chamarais de Selho. Tchau”.
No meio desta panóplia paroquial de veneração a Santos num estado cada vez mais laico, apenas se safam Barco, que se desprendeu da protecção do seu S. Cláudio e que agora é o maior centro português na produção de taças e troféus; e Ponte, que mandou o seu S. João à vida, depois de vários séculos sem ligar puto à paróquia, e que agora já é vila e tudo.
De S. Salvador de Briteiros passando por Santa Eufémia de Prazins, Santa Leocádia de Briteiros, Santa Maria de Airão, Santa Maria de Souto, Santiago de Candoso, Santo Estêvão de Briteiros, Santo Tirso de Prazins, São Clemente de Sande, São Cristóvão de Selho, São Faustino de ex-Vizela, São João Baptista de Airão, São Jorge de Selho, São Lourenço de Sande, São Lourenço de Selho, São Martinho de Candoso, São Martinho de Sande, São Paio, São Salvador de Souto, São Sebastião, São Tomé de Abação até S. Torcato só mesmo esta última parece ter alguma legitimidade moral e “santífica” para se chamar assim.

Carlos Guimarães

CARTILHA 4800 - D

Dias, drogado de Donim, deve dinheiro a Donato, um dandy, dactilógrafo da Darfil. Disseste que me devolvias o dinheiro em dois dias, Dias. Se não me dás o que me deves, dou-te com um dardo nos dentes, diz Donato a Dias. Dias difícieis de Dias, dadas as dificuldades de andar na droga.

AS CONSEQUÊNCIAS DO TERRAMOTO DE LISBOA EM GUIMARÃES

Pouco ou quase nada se fala do impacto que o terramoto de Lisboa, ocorrido a 1 de Novembro de 1755, teve na nossa insígne cidade. A verdade é que a destruição de Lisboa teve um duplo impacto na rotina da então Vila de Guimarães. É em nome da verdade Histórica que ousamos contar como foi.


O Terramoto de Lisboa trouxe grandes esperanças a Guimarães.

A chegada da notícia de que “um grande estrondo houvera arrasado Lisboa” aconteceu pelo lugar do costume, ou seja, pela actual Rua D. João I, outrora rua dos Gatos. E foi por aí que a boa nova chegou porque essa era a antiga estrada do Porto. E era daí que chegava quase tudo à nossa cidade. Foi a meio da tarde do dia 2 de Novembro de 1755. Mas não é da proveniência da notícia que quero falar. Aliás, com isto, já me perdi um pouco. Voltemos ao assunto.
De imediato, centenas de cidadãos centraram-se no Toural para debater o assunto e alimentar o mito. Instantes mais tarde, alguns deles já juravam ter sentido o abalo e outros garantiam que o mar tinha chegado até aos arrabaldes de Ponte. Segundo crónicas da época, alguns vimaranenses dormiram nos terreiros da cidade, do de S. Mamede até ao da Tulha, com medo de réplicas do sismo lisboeta. (1)
Como se sabe, o terramoto de 1755 não foi assim tão mau para Lisboa – permitiu a sua modernização enquanto cidade iluminista e geométrica, antecedento o Eixample, em Barcelona. Mas também trouxe grandes esperanças ao Povo de Guimarães (não confundir com o pasquim actual). Os grandes benefícios que o sismo de 1755 trouxe aos vimaraneneses – benesses essas apagadas por uma historiografia centrista – traduzem-se na criação de dois grandes movimentos cívicos em Guimarães, antecipando em séculos, uma mania de criar associações por tudo e por nada nesta cidade.


Eurico Eugénio de Guimarães, numa célebre imagem das litografias Beleza.

Em primeiro lugar, e ainda no dia 2 de Novembro de 1755, surgiu o Movimento De Novo Capital, encabeçado por um tal de Eurico Eugénio de Guimarães (2). Num panfleto pregado nas Igrejas de S. Francisco, S. Dâmaso e S. Tiago, na noite de 2 para 3 de Novembro de 1755, podia ler-se o seguinte:
"Nós os abaixo assinados, conhecendo e lamentando o que em Lisboa succedeo, com a terra a tremer várias vezes e que a estes impulsos se retirou o mar, deixando nas suas margens ver o fundo ás agoas nunca de antes visto e ainda com incêndios que arruinaram uma grande parte dessa cidade, ajuizamos que Lisboa nam tem mais condições físicas – presentes e futuras – para continuar a ser capital do nosso portuguez reino. Pelo que rogamos a sua alteza Real a espinhosa, porém necessária e inevitável solluçam de transferir em definitivo a capitalidade de Portugal para aquella que foe, outrora, a primeira capital deste país. Numa palavra, Guimarães. Cremos que a nossa cidade, com a acção do Menistro Sebastiam José de Carvalho e Mello, poderá garantir a todos a estabilidade que o reino tanto precisa. É que já fomos capital e saffámo-nos bem, e ainda não temos por costume a terra tremer e destruir tudo, de tempos a tempos. A uma questão de ellementar justiça repositória, junta-se, por ora, outra de extrema necessidade. Guimarães, de novo capital, já.”(4)
Dois dias depois, Guimarães respirava esperança: as mais de três mil assinaturas, incluindo as de vários analfabetos, fafenses e galegos, faziam crer que o sonho ia tornar-se, mais uma vez, realidade. Os Lobo-Machado adornavam o seu palacete convencidos de que as Cortes o iriam ocupar. O horto de Guimarães produzia as mais belas camélias para ofertar à Raínha Mariana de Espanha e às Infantas Maria Francisca, Maria Ana Francisca, Maria Francisca Doroteia e Maria Francisca Benedita. O Paço dos Duques, ex-futura residência dos Reis de Portugal, foi encerado de fio a pavio e as camas feitas de lavado, o que não acontecia desde o final do século XV. (5)
Mas o MDC foi sol de pouca dura. Misteriosamente, o primeiro signatário deste grandioso movimento apareceu enforcado na zona da Quintã apenas uma semana depois de ter iniciado esta inglória batalha. Causa da morte: envenenamento com cicuta. O Movimento De Novo Capital extinguia-se com a rapidez com que foi criado e mergulhava em dois séculos e meio de obscurantismo.


Eugénio Eurico de Guimarães Júnior em litografia tipo passe.

No entanto, Eurico Eugénio de Guimarães deixara um filho varão com a mesma carga genético-associativa de seu pai: Eugénio Eurico de Guimarães Júnior quis perpetuar a memória do seu progenitor e, anos mais tarde, criou a "Associação Queremos Uma Fachada Pombalina, Já" que conseguiu que, depois do grande fogo do Toural, a raínha Dona Maria I ali mandasse erigir uma fachada igual às de Lisboa. Como prova de gratidão, os Vimaranenses denominaram a rua dos Mercadores de Rua Dona Maria II, antecipando num século a Maria que haveria de vir. (6)
Portanto, cumprem-se precisamente hoje duzentos e cinquenta anos desde que Guimarães sonhou, por escassas semanas, em voltar a ser capital do reino. Tudo graças à esquecida obra de Eurico Eugénio de Guimarães. Um homem que, pelo que sonhou fazer, merecia que uma das ruas Eduardo de Almeida tivesse o seu nome.

Jacques Guimarães

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(1) GUIMARÃES, Jacques, in A VIDA E OBRA DO MEU ANTEPASSADO EURICO EUGÉNIO DE GUIMARÃES, página 143, Edição J.Guimarães.
(2) GUIMARÃES, Jacques, obra citada, Pág 255
(3) GUIMARÃES, Jacques, obra citada, Pág 363
(4) GUIMARÃES, Jacques, obra citada, Pág 368
(5) GUIMARÃES, Jacques, obra citada, Pág 754
(6) Já não me lembro onde é que li isto.